Noite na Taverna - Álvares de Azevedo
Biografia
Manuel Antônio Alvares de Azevedo nasceu em 12 de setembro de 1831 na cidade de São Paulo, de pai fluminense, estudante de Direito, e mãe goiana ambos de gente importante. Bacharelou-se em Letras no Colégio Pedro II em fins de 1847.
De 1844 a 1845 passou seis meses e fez alguns preparatórios em São Paulo, para onde foi morar no começo de 1848. Matriculou-se na Faculdade de Direito.
Mas nas férias de 1851-2 adoeceu no Rio, onde as passava sempre e depois de dolorosa operação para extrair um tumor na fossa ilíaca, morreu quando a cursava o 5° ano, no dia 25 de abril de 1852.
Tinha vinte anos e sete meses.
Apesar de muito jovem, era muito culto e, além do francês sabia bem inglês. o que lhe permitiu ler no original alguns dos grandes clássicos românticos, como Shakespeare que a maioria dos seus contemporâneos brasileiros lia em traduções.
Além deles, conhecia os clássicos latinos e portugueses. sem falar na paixão, em especial por Victor Hugo.
Segundo Antonio Cândido, a sua personalidade bem marcada pode ser aferida pelo cunho singular vista em algumas opiniões criticas nos seus ensaios.
Conhecido como o poeta macabro do romantismo, previu a morte de dois amigos_ que efetivamente desapareceram sem deixar rastro, sua vida pessoal é tema de grande confusão entre os críticos pois uns bendizem-no como um santo franzino e virginal, outros pinçam-lhe a alcunha de depravado e demoníaco.
É o principal representante no Brasil da influência byroniana ( ultra – romântica ) dos ingleses e alemães_ como todo escritor da paulista capital teve fim trágico bem a gosto burguês dos acadêmicos do Largo de São Francisco do século XIX.
Narrador
A narrativa de Noite na Taverna inicia-se em forma de drama. Macário e Satan (personagens do drama Macário, de Álvares de Azevedo) dialogam na primeira cena, em que Satan conduz Macário a uma orgia, a fim de que leia uma página da vida, cheia de sangue e de vinho.
Macário observa, da janela de uma taverna, uma sala fumacenta. À roda da mesa estão sentados cinco homens ébrios, Os mais revolvem-se no chão. Dormem ali mulheres desgrenhadas, umas lívidas, outras vermelhas e desgrenhadas.
Observem que essa cena de abertura tem claros alguns motivos da narrativa frenética, de que já falamos anteriormente, ou se preferirem, romance negro,
Ambos os gêneros dão à obra uma veste de caráter perverso. noturno satânico ou demoníaco, relatada por cinco personagens narradores: Solfieri, Bertram, Johann, Gennaro e Cláudius Herman que se caracterizam como personagens do "mal do século", ou seja, homens ébrios e devassos, cultivadores dos vícios e das perdições humanas, enfim, LIBERTINOS.
Macário é a testemunha da cena, uma noite de orgia, cujas histórias nos são narradas em 1a pessoa. A obra tem uma dimensão fantástica, com um densa atmosfera de sonho e embriaguez, oscilando sempre entre o real e o irreal (o mundo onírico e o mundo imaginário).
Por isso, as narrativas são difusas e os relatos não são muito claros para o leitor, da mesma forma que não são muito claramente vividos pelas personagens.
Deve ficar claro que o leitor entra em contato com as histórias pela ótica de Macário, que por sua vez, as verá pela ótica de Satan, o símbolo do mal.
Sabe-se que o satanismo, a queda para o mal, constitui um dos principais elementos do ultra-romantismo de Byron e Musset, o chamado "mal do século".
Por isso é importante esclarecer o lado do pólo do mal que predomina na obra em questão, personificado em especial pelas imagens do libertino e da mulher perdida, a prostituta, aquele que é o seu oposto complementar: o pólo do bem, manifestado através da mulher anjo, e a idéia do amor como regeneração de todos os vícios, enfim, das mais preciosas ambições amorosos e libertárias dos nossos byronianos.
Resumo
A estrutura narrativa de Noite na Taverna pertence a uma modalidade de romance que Antonio Cândido chama de DIFUSO, em oposição ao romance CONCENTRADO. com coerência e nexo causal entre os acontecimentos.
Cândido explica o romance difuso como "aquele onde os acontecimentos vão saindo caprichosamente uns cos outros ao sabor das associações e dos pretextos, sem haver uma diretriz que os concatene e dê a impressão de que são necessários (Cf. CANDIDO - A Educação pela Noite e Outros Ensaios).
Apesar de as cinco histórias narradas em Noite na Taverna corresponderem a cinco episódios independentes, há fortes elementos que os associam, dando, assim, uma unidade à obra.
Bem, veja o seguinte exemplo para que você possa compreender o anterior dito e também perceber como a estória é narrada:
Temos muitos viajantes ( marinheiros, marujos etc...) em uma noite a beber em uma taverna (título da obra ), neste ínterim cada um conta a sua aventura.
Saliento aqui que os textos são pesados tanto pelo elevado teor sexual como a morbidez sempre presente nos casos. Ao ler as estórias você compreenderá porque o poeta recebeu a alcunha de maldito.
Observe o perfil dos viajantes na tabela abaixo e depois veja as suas aventuras:
Nome do personagem
Perfil da personalidade
SOLFIERI
libertino e necrófilo _ possuiu uma mulher em estado de catalepsia ( doença em que a pessoa parece morta )
BERTRAM
Torna-se um perdido na Espanha, envolve-se com mulher que mata o marido e o filho para provar-lhe o amor
GENNARO
Estudante de pintura, casado _ apaixona-se pela filha de seu mestre.
CLAUDIUS HERMANN
Para conquistar uma mulher casada vale-se do ardil de dopá-la. Jogador inveterado
JOHANN
jovem cuja figura lembra uma donzela pelas formas suaves da expressão facial_ cometerá incesto e fratricídio.
SOLFIERI
Solfieri , o libertino, narra uma aventura que teria passado em Roma, cidade do fanatismo e a perdição: na alcova do sacerdote dorme a gosto a amásia, no leito da vendida se pendura o crucifixo lívido. E um requintar de gozo blasfemo que mescla o sacrilégio à convulsão do amor, o beijo lascivo à embriaguez da crença.
Certa noite, enquanto passeia. Solfieri vê uma imagem de mulher que canta e derrama lágrimas: "um choro de frenesi, num gemer de insânia". Ele a segue até o cemitério, onde ela parece soluçar... Acorda sozinho no cemitério, febril após uma noite de chuva, frio e sonhos da qual não consegue se esquecer. Observe o ambiente macabro formado pelo sonho, delírio e cemitério.
Um ano depois, sai de uma orgia com a condessa Bárbara e, embriagado, chega a um lugar bem escuro, a uma igreja. Lá ele encontra um caixão e ao abri-lo acha que a defunta é o anjo do cemitério. O que faz? Retira-a do caixão e a possui no templo.
Este episódio necrófilo, bastante erotizado (que nos faz lembrar a badalada posse da bela adormecida); de repente ele se choca como retorno da mulher á vida. Na realidade, ela sofria de catalepsia (estado mórbido, ligado à auto-hipnose e à histeria, caracterizado por enrijamento dos membros, insensibilidade, respiração e pulso lentos e palidez cutânea. seg. Novo Dicionário Aurélio).
A personagem Solfieri leva a mórbida criatura" à sua casa, onde ela morre "após duas noites e dois dias de delírio.
Ele, então, paga a um escultor uma estátua da moça, cava-lhe um túmulo e "estende o leito sobre ele"; e dorme durante um ano sobre o corpo da amada.
A estátua fica pronta e Solfieri procura convencer os amigos da veracidade da história, jurando pelo pai, que era conde e bandido, pela mãe, que fora a bela Messalina (prostituta) das ruas.
Abre a camisa, a fim de que vejam, em volta do seu pescoço, uma grinalda de flores mirradas, murcha e seca como o crânio dela!" A morbidez e sordidez do episódio põem á nossa mira o demonismo sexual latente em toda a obra.
BERTRAM
Bertram vira um perdido por causa de Angela. uma mulher que conhece na Espanha e com quem faz planos de se casar.
No entanto, a chamado do pai, parte para Dinamarca, onde fica dois anos. Seu pai morre e ele volta à Espanha, onde Ângela já está casada e com um filho.
Tornam-se amantes e o marido de Ângela descobre a traição. Ângela o degola e mata também o filho. Depois oferece os cornos ensanguentados dos dois como prova de amor a Bertram.
Fogem juntos, viajam muito e entregam-se aos vícios. Bertram caracteriza Angela da seguinte maneira:
"Ângela vestia-se de homem: era um formoso mancebo assim. No demais ela era corno todos os moços libertinos que nos meses de orgia batam com a taça na taça dela. Bebia como urna inglesa, fumava como uma sultana, montava a cavalo como um árabe, e atirava as armas corno um espanhol.
Um dia, ela partiu. Partiu. Mas sua lembrança ficou como o fantasma de um anjo mau perto do seu leito."
A maldade de .Angela contamina Bertram, que continua sua experiência perversa até que certa noite cai bêbado ás portas de um palácio, onde os cavalos machucam-lhe a cabeça, é socorrido por um velho nobre, viúvo, que tem uma filha de 18 anos, a quem Bertram desonra e vicia levado por "uma fatalidade infernal".
Enjoa-se da moça e a vende a um pirata, a quem ela envenena e afoga-se em seguida.
Bertram continua a sua ‘viagem".
Um dia, na Itália, tenta o suicídio, jogando - se de um rochedo, mas um marinheiro tira-o da água, puxando pelos cabelos. morrendo para salvá-lo.
Enquanto outros marinheiros, ao levarem, Bertram num barco em direção ao navio, choram a perda do companheiro, o maldito sorri da sua sina negra.
E convidado pelo capitão do navio para seguir viagem a bordo. Ele aceita participar da tripulação, porém com urna ressalva: o será somente nas horas em que estiverem combatendo. Bertram conhece a mulher do comandante ("criatura pálida, parecera a um poeta o anjo da esperança adormecendo esqueci do entre as ondas.., era uma santa"). Aos olhos de Berram, o comandante e mulher viviam um amor casto.
Por isso morre de amor pela pureza da jovem mulher ("um poeta a amaria de joelhos").
Durante uma batalha em que sofreram o ataque de uni navio pirata os dois se amam: "não sei como se passou o tempo todo que decorreu depois. Foi uma visão de gozos malditos - eram os amores de Satan e de Eloá, da morte e da vida, no leito do mar.
Após uma tempestade em que todos morrem e Bertram sobrevive, de qual se sai impune mais urna vez.
Restam alguns sobreviventes. Bertram, nesse momento, interrompe a história e tece alguns comentários sobre a miséria e loucura da existência. Prepara. assim, o leitor, para o desfecho monstruoso do narrativa: um velho entra na taverna e conta sua vida de poeta, libertino e vagabundo errante.
Traz consigo uma caveira envolvida num lenço vermelho. Afirma ter ela pertencido a um poeta e louco, jogando, assim, com a fusão de poesia e Loucura reforçada nas palavras de Bertram, que, no relato da antropofagia, ocorrida de acordo com as leis do mar, fala das duas últimas vítimas da fatalidade,
O comandante perde no jogo da sorte e é morto e devorado pelo casal. Logo a seguir, embora tenha prometido à amada que morreriam juntos, Bertram, após fazer amor com NUM GOZO CRUEL e vê-la enlouquecida, A SUFOCA, esfomeado como uma fera. Porém uma onda lhe rouba o cadáver e ele perde a consciência acordando a bordo de um navio inglês que lhe salvara.
Enfim, sai do pesadelo sem precisamente saber quanto tempo se passara.
GENNARO
Gennaro é aprendiz de um velho pintor, Godofredo, com quem mora. Este último é casado com Nauza - sua modelo de vinte anos a quem quer como urna filha – Godofredo também tem uma filha, Laura, da mesma idade da esposa.
Embora apaixonado platonicamente por Nauza e sentindo-se correspondido no amor, Gennaro é seduzido por Laura, que vai para a cama com o rapaz e depois de entregar-se a ele tornam-se amantes. Laura fica grávida e pede a Gennaro que se case com ela. Ele recusa e Laura adoece acusando-o pelo mal que lhe causara, enfraquecendo até entrar em coma e morrer.
Transcorre um ano. Godofredo, enlouquecido com a morte da filha, passa as noite em claro no quarto dela, enquanto Gennaro declara amor a Nauza que, apesar de hesitar, acaba aceitando seu amor. Amam-se no leito conjugal de Godofredo e Nauza.
Um dia o pintor os surpreende, leva Gennaro ao quarto de Lana e lhe mostra um quadro que pintara: a filha moribunda e Gennaro pálido como ela.
Corroído pelo remorso, Gennaro confessa tudo a Godofredo, que o ouve em silêncio e frio. Nauza também ouve a conversa escondida.
Certa noite o velho pintor pede a Gennaro que o acompanhe e leva-o a um lugar ermo onde há urna cabana à beira de um despenhadeiro. Após entrar e sair da cabana, onde conversa com uma senhora, Godofredo tortura Gennaro fazendo-o lembrar-se das suas infâmias e o força a atirar-se no precipício. Ele se atira para evitar ser assassinado.
Mas não morre. É salvo por um casal de camponeses. Recuperado, procura Godofredo, primeiramente com a intenção de pedir lhe perdão mas, ao invés disso, decide vingar-se. No entanto, encontra na casa onde praticara suas infâmias apenas dois cadáveres abandonados.
CLAUDIUS HERMANN
Claudius Hermann, além de libertino, é um jogador inveterado, Aposta em corridas. Um dia, no momento em que as corridas iam começar, vê uma mulher passando a cavalo e de imediato se apaixona por ela.
Durante algum tempo revê a amada no teatro, em bailes, etc. Seu nome, Duquesa Eleonora. Após seis meses de desejos ardentes. Claudius profana o lar da amada, dando-lhe uma mistura combinada de sonífero e afrodisíaco.
A cena se repete durante três meses. Até que uma noite, aproveitando-se do fato de o Duque também ter experimentado a bebida, rouba Eleonora e a leva para uma estalagem, onde espera que ela acorde.
Ao acordar, a duquesa, entre pavor e desespero, ouve a declaração de amor do libertino, que houvera nela visto a salvação de sua existência. Ao tentar de todas as maneiras convencê-lo a libertá-la, Eleonora só provoca a reafirmação de tudo o que já ouvira do jogador, que lhe dá duas horas para pensar, sabendo que já não tinha nenhuma reputação para defender.
A Duquesa Eleonora encontra, ao voltar ao quarto os versos que lhe escrevera o apaixonado e depois de lê-los muda de idéia dando-lhe urna resposta positiva.
A essa altura, o narrador, embriagado, se cala. Quem termina a narrativa é Arnold. O horrendo desfecho é este: certo dia Claudius Hermann encontra Eleonora e seu marido, o Duque de Maffio, mortos e abraçados um ao outro.
JOHANN / ÚLTIMO BEIJO DE AMOR
Johann e Artur (figura loira e mimosa corno a de uma donzela) jogam bilhar em Paris. A partida estava praticamente perdida para Artur que na hora que vai tacar a bola esbarra na mesa de bilhar estremecendo-a. Johann dá-me uma bofetada, pois se sente insultado. Em resposta, Artur rasga uma luva e atira-lhe no rosto. Decidem, então, duelar-se. Vão para o hotel, onde conversam.
Artur, após derramar uma lágrima sobre o anel que trazia no dedo, pede a Johann que, caso morra, entregue uma carta que tem no bolso a alguém. Propõe um brinde a misteriosa moça por quem derramara uma lágrima e também à vida ou morte de um dos dois. Logo após, mostra-lhe duas pistolas, uma carregada e a outra não, para que a sorte decida o destino de ambos.
A meia-noite, Artur tem um pressentimento e reza por sua mãe.
No duelo, Artur morre. Johann, cumprindo o que prometem a Artur, vai, no escuro, ao encontro da mulher.
Depois de possuí-la, Johann é seguido por um vulto que carrega consigo uma faca. Lutam e Johann vence. Na claridade não crê no que seus olhos vêem. Acabara de matar o próprio irmão, que o agredira para defender a honra da irmã.
São cenas fortes de incesto e fratricídio.
Biografia
Manuel Antônio Alvares de Azevedo nasceu em 12 de setembro de 1831 na cidade de São Paulo, de pai fluminense, estudante de Direito, e mãe goiana ambos de gente importante. Bacharelou-se em Letras no Colégio Pedro II em fins de 1847.
De 1844 a 1845 passou seis meses e fez alguns preparatórios em São Paulo, para onde foi morar no começo de 1848. Matriculou-se na Faculdade de Direito.
Mas nas férias de 1851-2 adoeceu no Rio, onde as passava sempre e depois de dolorosa operação para extrair um tumor na fossa ilíaca, morreu quando a cursava o 5° ano, no dia 25 de abril de 1852.
Tinha vinte anos e sete meses.
Apesar de muito jovem, era muito culto e, além do francês sabia bem inglês. o que lhe permitiu ler no original alguns dos grandes clássicos românticos, como Shakespeare que a maioria dos seus contemporâneos brasileiros lia em traduções.
Além deles, conhecia os clássicos latinos e portugueses. sem falar na paixão, em especial por Victor Hugo.
Segundo Antonio Cândido, a sua personalidade bem marcada pode ser aferida pelo cunho singular vista em algumas opiniões criticas nos seus ensaios.
Conhecido como o poeta macabro do romantismo, previu a morte de dois amigos_ que efetivamente desapareceram sem deixar rastro, sua vida pessoal é tema de grande confusão entre os críticos pois uns bendizem-no como um santo franzino e virginal, outros pinçam-lhe a alcunha de depravado e demoníaco.
É o principal representante no Brasil da influência byroniana ( ultra – romântica ) dos ingleses e alemães_ como todo escritor da paulista capital teve fim trágico bem a gosto burguês dos acadêmicos do Largo de São Francisco do século XIX.
Narrador
A narrativa de Noite na Taverna inicia-se em forma de drama. Macário e Satan (personagens do drama Macário, de Álvares de Azevedo) dialogam na primeira cena, em que Satan conduz Macário a uma orgia, a fim de que leia uma página da vida, cheia de sangue e de vinho.
Macário observa, da janela de uma taverna, uma sala fumacenta. À roda da mesa estão sentados cinco homens ébrios, Os mais revolvem-se no chão. Dormem ali mulheres desgrenhadas, umas lívidas, outras vermelhas e desgrenhadas.
Observem que essa cena de abertura tem claros alguns motivos da narrativa frenética, de que já falamos anteriormente, ou se preferirem, romance negro,
Ambos os gêneros dão à obra uma veste de caráter perverso. noturno satânico ou demoníaco, relatada por cinco personagens narradores: Solfieri, Bertram, Johann, Gennaro e Cláudius Herman que se caracterizam como personagens do "mal do século", ou seja, homens ébrios e devassos, cultivadores dos vícios e das perdições humanas, enfim, LIBERTINOS.
Macário é a testemunha da cena, uma noite de orgia, cujas histórias nos são narradas em 1a pessoa. A obra tem uma dimensão fantástica, com um densa atmosfera de sonho e embriaguez, oscilando sempre entre o real e o irreal (o mundo onírico e o mundo imaginário).
Por isso, as narrativas são difusas e os relatos não são muito claros para o leitor, da mesma forma que não são muito claramente vividos pelas personagens.
Deve ficar claro que o leitor entra em contato com as histórias pela ótica de Macário, que por sua vez, as verá pela ótica de Satan, o símbolo do mal.
Sabe-se que o satanismo, a queda para o mal, constitui um dos principais elementos do ultra-romantismo de Byron e Musset, o chamado "mal do século".
Por isso é importante esclarecer o lado do pólo do mal que predomina na obra em questão, personificado em especial pelas imagens do libertino e da mulher perdida, a prostituta, aquele que é o seu oposto complementar: o pólo do bem, manifestado através da mulher anjo, e a idéia do amor como regeneração de todos os vícios, enfim, das mais preciosas ambições amorosos e libertárias dos nossos byronianos.
Resumo
A estrutura narrativa de Noite na Taverna pertence a uma modalidade de romance que Antonio Cândido chama de DIFUSO, em oposição ao romance CONCENTRADO. com coerência e nexo causal entre os acontecimentos.
Cândido explica o romance difuso como "aquele onde os acontecimentos vão saindo caprichosamente uns cos outros ao sabor das associações e dos pretextos, sem haver uma diretriz que os concatene e dê a impressão de que são necessários (Cf. CANDIDO - A Educação pela Noite e Outros Ensaios).
Apesar de as cinco histórias narradas em Noite na Taverna corresponderem a cinco episódios independentes, há fortes elementos que os associam, dando, assim, uma unidade à obra.
Bem, veja o seguinte exemplo para que você possa compreender o anterior dito e também perceber como a estória é narrada:
Temos muitos viajantes ( marinheiros, marujos etc...) em uma noite a beber em uma taverna (título da obra ), neste ínterim cada um conta a sua aventura.
Saliento aqui que os textos são pesados tanto pelo elevado teor sexual como a morbidez sempre presente nos casos. Ao ler as estórias você compreenderá porque o poeta recebeu a alcunha de maldito.
Observe o perfil dos viajantes na tabela abaixo e depois veja as suas aventuras:
Nome do personagem
Perfil da personalidade
SOLFIERI
libertino e necrófilo _ possuiu uma mulher em estado de catalepsia ( doença em que a pessoa parece morta )
BERTRAM
Torna-se um perdido na Espanha, envolve-se com mulher que mata o marido e o filho para provar-lhe o amor
GENNARO
Estudante de pintura, casado _ apaixona-se pela filha de seu mestre.
CLAUDIUS HERMANN
Para conquistar uma mulher casada vale-se do ardil de dopá-la. Jogador inveterado
JOHANN
jovem cuja figura lembra uma donzela pelas formas suaves da expressão facial_ cometerá incesto e fratricídio.
SOLFIERI
Solfieri , o libertino, narra uma aventura que teria passado em Roma, cidade do fanatismo e a perdição: na alcova do sacerdote dorme a gosto a amásia, no leito da vendida se pendura o crucifixo lívido. E um requintar de gozo blasfemo que mescla o sacrilégio à convulsão do amor, o beijo lascivo à embriaguez da crença.
Certa noite, enquanto passeia. Solfieri vê uma imagem de mulher que canta e derrama lágrimas: "um choro de frenesi, num gemer de insânia". Ele a segue até o cemitério, onde ela parece soluçar... Acorda sozinho no cemitério, febril após uma noite de chuva, frio e sonhos da qual não consegue se esquecer. Observe o ambiente macabro formado pelo sonho, delírio e cemitério.
Um ano depois, sai de uma orgia com a condessa Bárbara e, embriagado, chega a um lugar bem escuro, a uma igreja. Lá ele encontra um caixão e ao abri-lo acha que a defunta é o anjo do cemitério. O que faz? Retira-a do caixão e a possui no templo.
Este episódio necrófilo, bastante erotizado (que nos faz lembrar a badalada posse da bela adormecida); de repente ele se choca como retorno da mulher á vida. Na realidade, ela sofria de catalepsia (estado mórbido, ligado à auto-hipnose e à histeria, caracterizado por enrijamento dos membros, insensibilidade, respiração e pulso lentos e palidez cutânea. seg. Novo Dicionário Aurélio).
A personagem Solfieri leva a mórbida criatura" à sua casa, onde ela morre "após duas noites e dois dias de delírio.
Ele, então, paga a um escultor uma estátua da moça, cava-lhe um túmulo e "estende o leito sobre ele"; e dorme durante um ano sobre o corpo da amada.
A estátua fica pronta e Solfieri procura convencer os amigos da veracidade da história, jurando pelo pai, que era conde e bandido, pela mãe, que fora a bela Messalina (prostituta) das ruas.
Abre a camisa, a fim de que vejam, em volta do seu pescoço, uma grinalda de flores mirradas, murcha e seca como o crânio dela!" A morbidez e sordidez do episódio põem á nossa mira o demonismo sexual latente em toda a obra.
BERTRAM
Bertram vira um perdido por causa de Angela. uma mulher que conhece na Espanha e com quem faz planos de se casar.
No entanto, a chamado do pai, parte para Dinamarca, onde fica dois anos. Seu pai morre e ele volta à Espanha, onde Ângela já está casada e com um filho.
Tornam-se amantes e o marido de Ângela descobre a traição. Ângela o degola e mata também o filho. Depois oferece os cornos ensanguentados dos dois como prova de amor a Bertram.
Fogem juntos, viajam muito e entregam-se aos vícios. Bertram caracteriza Angela da seguinte maneira:
"Ângela vestia-se de homem: era um formoso mancebo assim. No demais ela era corno todos os moços libertinos que nos meses de orgia batam com a taça na taça dela. Bebia como urna inglesa, fumava como uma sultana, montava a cavalo como um árabe, e atirava as armas corno um espanhol.
Um dia, ela partiu. Partiu. Mas sua lembrança ficou como o fantasma de um anjo mau perto do seu leito."
A maldade de .Angela contamina Bertram, que continua sua experiência perversa até que certa noite cai bêbado ás portas de um palácio, onde os cavalos machucam-lhe a cabeça, é socorrido por um velho nobre, viúvo, que tem uma filha de 18 anos, a quem Bertram desonra e vicia levado por "uma fatalidade infernal".
Enjoa-se da moça e a vende a um pirata, a quem ela envenena e afoga-se em seguida.
Bertram continua a sua ‘viagem".
Um dia, na Itália, tenta o suicídio, jogando - se de um rochedo, mas um marinheiro tira-o da água, puxando pelos cabelos. morrendo para salvá-lo.
Enquanto outros marinheiros, ao levarem, Bertram num barco em direção ao navio, choram a perda do companheiro, o maldito sorri da sua sina negra.
E convidado pelo capitão do navio para seguir viagem a bordo. Ele aceita participar da tripulação, porém com urna ressalva: o será somente nas horas em que estiverem combatendo. Bertram conhece a mulher do comandante ("criatura pálida, parecera a um poeta o anjo da esperança adormecendo esqueci do entre as ondas.., era uma santa"). Aos olhos de Berram, o comandante e mulher viviam um amor casto.
Por isso morre de amor pela pureza da jovem mulher ("um poeta a amaria de joelhos").
Durante uma batalha em que sofreram o ataque de uni navio pirata os dois se amam: "não sei como se passou o tempo todo que decorreu depois. Foi uma visão de gozos malditos - eram os amores de Satan e de Eloá, da morte e da vida, no leito do mar.
Após uma tempestade em que todos morrem e Bertram sobrevive, de qual se sai impune mais urna vez.
Restam alguns sobreviventes. Bertram, nesse momento, interrompe a história e tece alguns comentários sobre a miséria e loucura da existência. Prepara. assim, o leitor, para o desfecho monstruoso do narrativa: um velho entra na taverna e conta sua vida de poeta, libertino e vagabundo errante.
Traz consigo uma caveira envolvida num lenço vermelho. Afirma ter ela pertencido a um poeta e louco, jogando, assim, com a fusão de poesia e Loucura reforçada nas palavras de Bertram, que, no relato da antropofagia, ocorrida de acordo com as leis do mar, fala das duas últimas vítimas da fatalidade,
O comandante perde no jogo da sorte e é morto e devorado pelo casal. Logo a seguir, embora tenha prometido à amada que morreriam juntos, Bertram, após fazer amor com NUM GOZO CRUEL e vê-la enlouquecida, A SUFOCA, esfomeado como uma fera. Porém uma onda lhe rouba o cadáver e ele perde a consciência acordando a bordo de um navio inglês que lhe salvara.
Enfim, sai do pesadelo sem precisamente saber quanto tempo se passara.
GENNARO
Gennaro é aprendiz de um velho pintor, Godofredo, com quem mora. Este último é casado com Nauza - sua modelo de vinte anos a quem quer como urna filha – Godofredo também tem uma filha, Laura, da mesma idade da esposa.
Embora apaixonado platonicamente por Nauza e sentindo-se correspondido no amor, Gennaro é seduzido por Laura, que vai para a cama com o rapaz e depois de entregar-se a ele tornam-se amantes. Laura fica grávida e pede a Gennaro que se case com ela. Ele recusa e Laura adoece acusando-o pelo mal que lhe causara, enfraquecendo até entrar em coma e morrer.
Transcorre um ano. Godofredo, enlouquecido com a morte da filha, passa as noite em claro no quarto dela, enquanto Gennaro declara amor a Nauza que, apesar de hesitar, acaba aceitando seu amor. Amam-se no leito conjugal de Godofredo e Nauza.
Um dia o pintor os surpreende, leva Gennaro ao quarto de Lana e lhe mostra um quadro que pintara: a filha moribunda e Gennaro pálido como ela.
Corroído pelo remorso, Gennaro confessa tudo a Godofredo, que o ouve em silêncio e frio. Nauza também ouve a conversa escondida.
Certa noite o velho pintor pede a Gennaro que o acompanhe e leva-o a um lugar ermo onde há urna cabana à beira de um despenhadeiro. Após entrar e sair da cabana, onde conversa com uma senhora, Godofredo tortura Gennaro fazendo-o lembrar-se das suas infâmias e o força a atirar-se no precipício. Ele se atira para evitar ser assassinado.
Mas não morre. É salvo por um casal de camponeses. Recuperado, procura Godofredo, primeiramente com a intenção de pedir lhe perdão mas, ao invés disso, decide vingar-se. No entanto, encontra na casa onde praticara suas infâmias apenas dois cadáveres abandonados.
CLAUDIUS HERMANN
Claudius Hermann, além de libertino, é um jogador inveterado, Aposta em corridas. Um dia, no momento em que as corridas iam começar, vê uma mulher passando a cavalo e de imediato se apaixona por ela.
Durante algum tempo revê a amada no teatro, em bailes, etc. Seu nome, Duquesa Eleonora. Após seis meses de desejos ardentes. Claudius profana o lar da amada, dando-lhe uma mistura combinada de sonífero e afrodisíaco.
A cena se repete durante três meses. Até que uma noite, aproveitando-se do fato de o Duque também ter experimentado a bebida, rouba Eleonora e a leva para uma estalagem, onde espera que ela acorde.
Ao acordar, a duquesa, entre pavor e desespero, ouve a declaração de amor do libertino, que houvera nela visto a salvação de sua existência. Ao tentar de todas as maneiras convencê-lo a libertá-la, Eleonora só provoca a reafirmação de tudo o que já ouvira do jogador, que lhe dá duas horas para pensar, sabendo que já não tinha nenhuma reputação para defender.
A Duquesa Eleonora encontra, ao voltar ao quarto os versos que lhe escrevera o apaixonado e depois de lê-los muda de idéia dando-lhe urna resposta positiva.
A essa altura, o narrador, embriagado, se cala. Quem termina a narrativa é Arnold. O horrendo desfecho é este: certo dia Claudius Hermann encontra Eleonora e seu marido, o Duque de Maffio, mortos e abraçados um ao outro.
JOHANN / ÚLTIMO BEIJO DE AMOR
Johann e Artur (figura loira e mimosa corno a de uma donzela) jogam bilhar em Paris. A partida estava praticamente perdida para Artur que na hora que vai tacar a bola esbarra na mesa de bilhar estremecendo-a. Johann dá-me uma bofetada, pois se sente insultado. Em resposta, Artur rasga uma luva e atira-lhe no rosto. Decidem, então, duelar-se. Vão para o hotel, onde conversam.
Artur, após derramar uma lágrima sobre o anel que trazia no dedo, pede a Johann que, caso morra, entregue uma carta que tem no bolso a alguém. Propõe um brinde a misteriosa moça por quem derramara uma lágrima e também à vida ou morte de um dos dois. Logo após, mostra-lhe duas pistolas, uma carregada e a outra não, para que a sorte decida o destino de ambos.
A meia-noite, Artur tem um pressentimento e reza por sua mãe.
No duelo, Artur morre. Johann, cumprindo o que prometem a Artur, vai, no escuro, ao encontro da mulher.
Depois de possuí-la, Johann é seguido por um vulto que carrega consigo uma faca. Lutam e Johann vence. Na claridade não crê no que seus olhos vêem. Acabara de matar o próprio irmão, que o agredira para defender a honra da irmã.
São cenas fortes de incesto e fratricídio.
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